sexta-feira, 11 de maio de 2012

Ineficiência. Duração razoável do processo: a “celeridade assistida”. Utilitarismo processual.

* Maissa Assunção da Costa

A ineficiência da maior parte dos serviços públicos no Brasil é assombrosa. Os órgãos do Poder Judiciário, é claro, não escapam do mesmo diagnóstico. O Poder Público, titular do direito de julgar e punir os que transgridem o ordenamento jurídico há muito vem deixando de cumprir fielmente seu dever.

Somam-se a isto, os problemas estruturais que comprometem o bom funcionamento do aparelho estatal. A ausência de funcionários é, hoje, um dos principais desafios a ser superados. Cita-se, aqui o de magistrados, por exemplo. As estatísticas nos mostram que o número de casos levados ao conhecimento do Judiciário é exponencialmente maior do que o de juízes aptos a solucioná-los. O resultado disto é do conhecimento de todos: gabinetes lotados, audiências marcadas para além de um ano da data de ajuizamento da ação e muita demora na apreciação dos processos.


Sendo ineficiente o sistema processual, todo o ordenamento jurídico passa a carecer de real efetividade. Inevitavelmente, as normas de direito material se transformam em mero texto escrito, sem a garantia de sua correlata realização, no mundo empírico, por meio do processo.

Na tentativa de burlar essa problemática, muitas são as políticas públicas implantadas, a exemplo da instituição de Juizados Especiais e de alterações legislativas voltadas à celeridade processual.

Por tudo quanto foi dito acerca das diretrizes do garantismo no processo penal, destaca-se, aqui, outro ponto que está intrinsecamente relacionado a este modelo normativo de Direito: a duração razoável do processo.

Principalmente após a edição da Emenda Constitucional nº45/2004, muitos têm sido os estudos acerca da aplicação efetiva deste princípio no bojo dos procedimentos em curso, bem como daqueles que ainda serão instaurados. A bem da verdade, o que se percebe é o aprimoramento do sistema processual, com vistas de tornar mais ágil e célere a prestação jurisdicional, por meio da inclusão do mandamento em voga dentro do rol dos direitos fundamentais.

Inserido no ordenamento jurídico pátrio com status de princípio fundamental (inciso LXXVIII do art. 5º), tendo em vista ser a sua lavra do Poder Constituinte Derivado Reformador, o princípio denominado "duração razoável do processo", busca salvaguardar a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação com vistas à efetividade da prestação jurisdicional.

Ressalta-se, por oportuno, que essa mudança não pode comprometer a segurança jurídica. Os princípios da celeridade e da duração do processo devem ser aplicados em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, assegurando que o processo não se estenda além do prazo razoável e tampouco venha a comprometer a plena defesa e o contraditório.

Trata-se, portanto, de uma “celeridade assistida”, destinada a satisfazer os anseios dos jurisdicionados em um menor período de tempo, sem, contudo, deixar de observar a estrita legalidade que deve permear todo e qualquer procedimento judicial. É, em outras palavras, uma garantia procedimental.

Esse entendimento aplica-se ao tempo no processo, tendo em vista que a prestação jurisdicional apressada pode acarretar verdadeira injustiça, pois a jurisdição exige reflexão. Dito de outra forma, tem-se que o atendimento das políticas de economia processual jamais podem se sobrepor à observância de direitos fundamentalmente consagrados.

Acerca do tema, Ronald Dworkin denominou de “utilitarismo processual”, o fenômeno em que se impõe o sacrifício incondicional de direitos individuais em detrimento de utópicos interesses da coletividade.

O utilitarismo processual refere-se, como bem evidencia Aury Lopes Junior, à idéia de combate a criminalidade a qualquer custo. Busca-se a introdução de um processo penal mais célere e eficaz, no sentido de diminuir as garantias processuais dos cidadãos, em nome do interesse estatal de mais rapidamente apurar e apenar condutas. Em suma, é sinônimo de exclusão e supressão de direitos fundamentais, com vistas ao alcance da máxima eficiência .

É inconteste o fato de que todo processo demanda tempo para que sejam cumpridas as formalidades previstas em lei. A sociedade, carente dos direitos mais essenciais como segurança pública, saúde, transporte, dentre outros, pressiona o Judiciário à solução eficaz desses problemas e ao combate da criminalidade. O Poder Público, ao seu tempo, transfere para o indivíduo a falibilidade do aparato estatal, inapto para satisfazer todas as questões levadas a ele, seja por motivos estruturais, seja por insuficiência de pessoal.

O certo é que por mais insignificante que seja o objeto da lide, alguns atos processuais simplesmente não podem ser suprimidos, sob pena de que seja comprometido todo o procedimento.

Neste diapasão, o que se defende é a necessária compatibilização entre a aptidão do processo ao alcance de resultados substancialmente justos e uma prestação jurisdicional célere, resguardados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

É mister destacar que os instrumentos estatais para sanar os problemas supramencionados variam entre a aplicação de multas até a imposição de penas privativas de liberdade, todavia, em maior ou menor grau, o resultado é sempre visualizado sob a ótica da supressão dos direitos fundamentais do agente.

O exemplo mais pertinente desse tipo de agressão ao homem é o movimento de lei e ordem, caracterizado pela ampla repressão e pela implantação da justiça negociada, cuja ideia é a de que se destinem tratamentos diferenciados, de acordo com a infração penal cometida, ou seja, um total dissenso, frente a flagrante ofensa dos princípios fundamentais mais caros ao homem, tal qual a presunção da inocência, o contraditório e a igualdade.

Como é sabido, o Direito Penal é mínimo e, como tal, deve imiscuir-se na sociedade na exata medida de sua necessidade, ou seja, nas situações em que nenhum outro ramo do direito ou instrumento de política pública possa ser aplicado.

A salvaguarda do indivíduo ocorre por meio do monopólio estatal da aplicação da pena, a qual deve ser precedida de um processo realizado sob o manto da legalidade estrita, respeitada uma série de limites destinados a evitar abusos no exercício do poder de perseguir e punir.

Neste contexto, o procedimento garantista é instrumento a serviço da ordem constitucional, apto à aplicação de pena ao indivíduo, por meio da imprescindível atenção aos direitos fundamentais.

Sob esta ótica, buscando limitar o poder punitivo, o garantismo, através da racionalidade e confiabilidade do juízo, tutela a pessoa humana contra a arbitrariedade déspota, ensejando, assim, um Estado Democrático de Direito.

Notas:

LOPES JUNIOR, Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal. Fundamentos da Instrumentalidade Garantista, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 48.

Referências Bibliográficas:

LOPES JUNIOR, Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal. Fundamentos da Instrumentalidade Garantista, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 48.

DUARTE, Ronnie Preuss. Garantia de Acesso à Justiça – Os direitos processuais fundamentais. Coimbra: Coimbra, 2007, pp.208/218.

FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão – Teoria do Garantismo Penal. São Paulo, Revista dos Tribunais:3ª Edição, 2010, pp. 494/504.

Autora:

*Maissa Assunção da Costa – Advogada, Bacharela em Direito. Especializanda em Direito e Processo Penal pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT

Costa, Maissa Assunção da.  Ineficiência, Garantismo e Duração razoável do processo. A “celeridade assistida”. Utilitarismo processual. Blog Palavra Direito, São Paulo - SP, 11 de Maio de 2012. Disponível em: http://palavradireito.blogspot.com/2012/05/ineficiencia-duracao-razoavel-do.html>. Acesso em: (data e hora do acesso)

2 comentários:

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